Brasil produtor de alimentos imediatista no presente, sem visão de futuro

Com, José Batista - Advogado e membro da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra – CPT. Um dos articuladores nacionais da Rede Nacional dos Advogados Populares – Renap e compõe a Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (seção Pará).

O cenário do Brasil contemporâneo no campo é conseqüência de um modelo "nacional desenvolvimentista" criado pelo regime militar e que persiste nos dias atuais principalmente no campo, na região Norte do país, em um local conhecido como o Polígono da Violência.
A pressão expansionista dos grupos econômicos (sejam eles, madeireiros, grileiros, grandes proprietários de terra, mineradoras e obras do PAC) sobre o solo, a floresta e as comunidades tradicionais (pescadores, remanescentes de quilombos, ribeirinhos e indígenas, além de posseiros com atividade familiar agrícola) não é fiscalizada e configura um cenário agrário imediatista e sem visão de futuro.

Mesmo os povos tradicionais ainda provocam e sempre provocaram impactos na sua forma de utilizar o solo. 


As tribos sambaquis e coivara tradicionalmente praticavam e praticam a agricultura de queimada. Como os solos tropicais são lavados pela imensa quantidade  de chuva, possuem  poucos nutrientes. Esses nutrientes estão na vegetação de cobertura. A sabedoria passada de geração em geração ensinou a esses povos primitivos da Amazônia que as cinzas desta vegetação fertilizam o solo. 

Portanto as queimadas sempre aconteceram na região, mas sempre em pequena escala. Onde há queimada, há além de emissão de CO2, supressão de floresta e biodiversidade,  e ainda esgotamento do próprio solo,  Esse tipo de cultura se deslocava de uma área a outra , a pequena escala de utilização possibilitava a recuperação do solo e da biota.


O princípio era do local atender ao local, o desenvolvimento sustentável tende a retomar este princípio, conhecido também como local action, sair da escala global para atender ao local. De qualquer forma a queimada exerce pressão sobre a floresta, pois a queimada não seleciona as espécies endêmicas (que ocorrem em um só local).

A Amazônia, durante muitos anos, foi vista pelos estudiosos como um “deserto verde”, ou seja, era considerada um lugar onde não havia ninguém, só mata. Todos acreditavam que sua ocupação teria acontecido há pouco tempo e por um pequeno número de habitantes, mas estudos recentes apontam exatamente o contrário, uma rica e detentora de uma sabedoria milenar sempre habitou a floresta.

À época da implementação do modelo desenvolvimentista que explodiu no Sudeste do país, na década de 30, seguido da industrialização com capital transnacional de JK a partir de 50, o ideário de reforma agrária,  desenvolvimento e integração do país à Amazônia (Programa de Integração Nacional), fez com o que os militares empurrassem as famílias de agricultores de Minas Gerais e do interior de São Paulo, rumo ao Norte do país, por conta da instalação de grandes complexos industriais em propriedades tradicionalmente rurais.

Essas famílias de “sem terras” eram levadas à Região Norte com a promessa de reforma agrária e de desenvolvimento da região. Nessa época as grandes obras como a Transamazônica atraíram mão de obra. Tornando a região um misto de sem terras do sudeste com os povos tradicionais que tinham suas terras cortadas pelas grandes estradas e não remarcadas.
Ao longo do tempo essas comunidades foram ficando imprensadas entre os latifúndios, empresas de mineração e tiveram suas atividades tradicionais de subsistência afetadas, com a poluição dos Rios e solo decorrente do uso intensivo de agrotóxicos e da exploração de minério de ferro.

Para agravar a situação o governo doava grandes porções de terras a grupos econômicos como a Volkswagen, beneficiava os grileiros às custas da não regularização dos posseiros.

Deu-se assim o início dos conflitos da terra no Brasil. Atualmente a perspectiva de futuro é no mínimo incerta. O Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) divulgou em junho de 2011 estudo denominado: Projeções do Agronegócio 2010/11-2020/2021. O Brasil se consolidará como uma potência agrícola nos próximos dez anos e vai disputar a liderança na produção de alimentos com os Estados Unidos. A Safra de grãos deve crescer 23% até 2021 e a área de colheita será 9,5% maior que a atual.

 Além de mais produção e mais vendas, o Mapa avalia que o País terá uma nova fronteira agrícola – batizada como Matopiba (formada pelo Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia). Essas áreas estão atraindo novas lavouras porque têm terras mais baratas que a região Centro-Oeste e poderão aumentar a produção de algodão, frango, carne bovina e soja; além de celulose e papel.


A produção total do país passará da  atual de 24,6 milhões de toneladas de carne para 31,2 milhões de toneladas na temporada 2020/21 (crescimento de 36,5%).  Se o cenário se confirmar, o Brasil terá 12% do mercado de milho; 33,2% do mercado de grãode soja; 49% da participação da carne de frango; 30,1% da carne bovina e 12% da carne suína.

O crescimento das exportações será acompanhado da expansão do consumo interno, que segundo o Mapa “continuará sendo o principal destino da produção: 85,4% do milho; 83% da carne bovina; 81% da carne suína; 67% da carne de frango; e 64,7% da soja”.
A divulgação das pretensões do Brasil alcançar a liderança da produção de alimentos no Brasil só aumenta a preocupação com a forma de utilização do solo.

O solo foi o recurso natural que primeiro chamou a atenção de estudiosos americanos. Coincidência ou não os Estados Unidos dominaram a produção alimentar global por décadas, mas protegendo, conservando e avançando em tecnologias e em legislação, com fiscalização e multa severa e também benefícios para agricultores que produzem de acordo com as leis de uso do solo.

No Brasil tampouco as leis são cumpridas, menos ainda fiscalizadas. A fome é por maior produção, sem visão de futuro.


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